O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou novas taxas extras a diversos produtos exportados por Canadá, México e China para o seu país. Os impostos extras devem afetar os negócios da Samsung, NVIDIA (via Foxconn), Lenovo, montadoras de veículos e outras empresas de tecnologia e até brinquedos, de acordo com a imprensa norte-americana.
Um estudo da Associação de Tecnologia de Consumo (CTA, na sigla em inglês) previu um aumento de 46% nos preços de notebooks e tablets, e de 40% em consoles de videogame. Celulares podem aumentar em 26%. Mas isso se Trump aumentasse em 10% a 20% de tarifas em todos os produtos importados, e de 60% em produtos vindos da China.
As novas taxas afetam setores que vão desde eletrônicos até equipamentos aeroespaciais, passando por eletrodomésticos e dispositivos médicos. E isso só falando em México. O Canadá é um importante exportador de madeira serrada, insumo importante para a construção de casas nos EUA. Abaixo, eu resumo um pouco do que as novas taxas afetam e analiso o que mais pode acontecer com a economia americana, de acordo com especialistas.
De carros a IA, passando por eletrônicos de todos os tipos
A Foxconn anunciou, em novembro de 2024, que construiria uma fábrica gigantesca em Guadalajara, México, para produzir servidores de inteligência artificial da NVIDIA. Lenovo e Hisense também anunciaram pretensão de fabricar produtos no México, e também seriam afetadas pelas novas tarifas.
De acordo com a Comissão de Comércio Internacional, eletrônicos do país latino cresceram de US$ 86 bilhões em 2019 para US$ 108 bilhões em 2023. Isso representa cerca de 18% do total de importações de eletrônicos dos EUA, atrás apenas da China, que respondeu por US$ 146 bilhões há dois anos. A Lenovo tem fábrica no México para abastecer os três países norte-americanos, ou seja, o mercado de notebooks deve ser afetado.
O México também é responsável por cerca de 86% das importações de peças automobilísticas dos EUA, setor que também será afetado caso as novas taxas sejam mantidas. A mudança afeta até mesmo empresas americanas, como a General Motors e a Ford, que possuem grandes fábricas no país latino.
As taxas afetam também a produção de veículos automotores no Canadá. A Honda anunciou no ano passado investimentos de US$ 11 bilhões na produção de veículos elétricos e baterias em uma fábrica em Ontário, incluindo novas fábricas e expansão de plantas já existentes. Toyota e Volvo também possuem fábricas no país mais ao norte.
Curioso lembrar, ainda, que o próprio Trump assinou um acordo com os dois países vizinhos no final de seu mandato anterior, em 2020, para incentivar o comércio entre as três nações. Agora, ele rasga o acordo e impõe tarifas extras a dois de seus maiores parceiros comerciais.
Samsung, Lego e outras previram o problema e já se mobilizavam
É claro que as empresas não foram pegas de surpresa, mas não havia muito tempo hábil para se preparar para mudanças nos primeiros dias de governo. Trump assumiu em 20 de janeiro, apenas duas semanas atrás, e já assinou um monte de ordens executivas que afetam a economia não só dos EUA, mas do mundo inteiro.
Algumas companhias, no entanto, já se mobilizavam para reduzir os impactos. Samsung e LG cogitam levar a produção de eletrodomésticos para território estadounidense, enquanto a Lego já anunciou, em 2022, ter planos de abrir uma fábrica na Virgínia para não perder muito do mercado de blocos de montar.
A Toyota já tem uma fábrica de baterias em construção na Carolina do Norte, seguindo um plano iniciado em 2017, durante o primeiro mandato de Trump e as primeiras ameaças de sobretaxas. A montadora também abriu um fábrica de veículos no Alabama em 2021, em conjunto com a Mazda. Esta última, inclusive, deve mudar parte da fabricação no México para esta fábrica no Alabama, já que 70% de sua produção mexicana acaba indo para os EUA.
No entanto, a realidade não é tão simples para todas as empresas. Muitas esbarram nos salários cobrados pelos trabalhadores estadounidenses, que não aceitam pagamentos tão baixos como pessoas de outros países. Mas essa não é a única questão: os custos de manter fábricas nos EUA são simplesmente muito altos.
Tarifas podem prejudicar economia dos EUA, em vez de incentivar
“Venham fabricar seus produtos na América”, disse Trump no Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíca. “Mas se você não fabricar seus produtos na América, que é sua prerrogativa, então você simplesmente terá que pagar uma tarifa”. A ideia parece interessante, mas não é tão simples.
A questão aqui não é questionar um governo de tentar incentivar a produção local, que gera empregos e estimula a economia nacional. O ponto é como o presidente dos Estados Unidos está fazendo isso: sem nenhum planejamento prévio. Ele simplesmente assina ordens criando novas taxas sem antes preparar o país para a nova demanda.
Segundo analistas do Instituto Peterson de Economia Internacional, impostos “têm um histórico ruim” em estimular a indústria nacional. É bom lembrar, caso alguém não saiba o básico de como funcionam os impostos de importação, que quem paga essas taxas são as empresas do país que as impõem, não quem está exportando — como o próprio Trump parece acreditar (ou acreditava no passado). Em outras palavras, o presidente dos EUA está prejudicando a própria economia tanto quanto ou até mais do que os países que diz estar retaliando.
A administração Trump 2 defende que, no primeiro mandato, a aplicação de novas taxas não afetou a inflação. Porém, foram tarifas pequenas em alguns produtos chineses, não uma taxa extra de 25% em importações do Canadá e México, que até recentemente possuíam um acordo de livre comércio com o país e, portanto, têm produtos e insumos importantes para a economia dos EUA.
Em vez de incentivar a economia dos EUA, as ações de Trump podem levar ao que ficou apelidado de “efeito máquina de lavar”. Curiosamente, no primeiro mandato do bilionário, ele impôs tarifas sobre máquinas de lavar estrangeiras, para frear a importação do eletrodoméstico e incentivar a produção local. O plano deu errado, segundo um estudo realizado por três economistas: Aaron Flaaen, Ali Hortacsu e Felix Tintelnot.
A análise dos três concluiu que o preço médio das máquinas de lavar nos EUA aumentaram em 12% por conta do imposto. E, “embora alguns empregos tenham sido criados, os consumidores pagaram um custo muito alto”, observou Tintelnot, em conversa com o site da BBC.
Como resultado, cada emprego criado pelo imposto gerou um gasto de US$ 820 a mais no mercado de máquinas de lavar do país.
Agora é esperar para ver se haverá um efeito semelhante com carros, eletrônicos e tantos outros produtos que receberam novas taxas extras pela decisão de Donald Trump.
Fontes: CNBC, BBC Brasil, New York Times, TechCrunch